- 2 Jun, 11:09Nuno Matias
- 13 Jan, 14:55Admin User
- 28 Jul, 16:56Admin User
Estudos
NEM NACIONAL, NEM ESTRANGEIRO: REFLEXÕES SOBRE UM PROJETO ÉTNICO-POLÍTICO BRASILEIRO
A Assembleia Constituinte de 1 946 instaurou um debate parlamentar inusitado no panorama histórico-jurídico brasileiro, fazendo ascender ao âmbito constitucional a temática da identidade entre os povos do Brasil e de Portugal. A argumentação realizada em plenário pelos deputados e senadores constituintes, entre eles o sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, justificou a condição singular a ser outorgada aos portugueses com base em pressupostos de afinidade étnica, cultural e mesmo religiosa e racial que manteriam com os brasileiros. O debate gerou um paradigma integrado à Carta de 1946 que se fez presente em políticas de imigração e na produção legislativa sobre estrangeiros, aquisição da nacionalidade e exercício de direitos. A especialidade atribuída ao português foi também incluída no texto da Constituição de 1967 e na atual de 1988. Com efeito, quase dois séculos de independência entre Brasil e Portugal não extinguiram certos laços institucionais e simbólicos que vinculam as duas nações, para além do idioma e do legado histórico que compartilham. Um desdobramento tem sido a maneira singular com que diretrizes políticas e legais trataram a presença dos portugueses no Brasil a partir de 1822, quando o processo de emancipação atingiu seu ponto incontornável. Ocorrência extraordinária na construção dos Estados nacionais americanos e das formas de ruptura com as metrópoles europeias, o destaque político do ex-colonizador traduziu-se em privilégios que o distinguiram de outros estrangeiros, ao favorecer sua fixação no território brasileiro e a aquisição da nacionalidade, entre outros aspectos. O fenômeno expressou-se primeiramente de maneira descontínua, com frequência por meio de uma retórica de parentesco (filial, fraternal), em que ressaltava a existência de supostos laços de família a distinguir o lusitano no ordenamento da ex-colônia emancipada. Tal situação se verificou ao longo do século XIX e nas primeiras décadas do século XX e esteve presente na formulação de diretrizes imigratórias do período imperial e da primeira fase republicana. Durante o Estado Novo de Getúlio Vargas (1 937-1 945), um conjunto de normas legais e diretivas consulares facilitou a entrada e fixação do imigrante português no país, frente a outros estrangeiros. | |