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SOCIEDADE (A) PORTUGUESA EM CURITIBA: UM PROJETO IDENTITÁRIO (1878-1900)

Roseli Boschilia
Documento PDF A SOCIEDADE PORTUGUESA EM CURITIBA UM PROJETO IDENTITÁRIO (1878-1900).pdf

A experiência da imigração leva o indivíduo a ter um novo olhar sobre o outro, a posicionar-se diante do desconhecido, a perceber diferenças e semelhanças, enfim, a estabelecer relações que se constroem com base na alteridade. Assim, refletir sobre o fenômeno social da imigração e as implicações que dele decorrem remete a outro conceito, o de identidade social, cuja produção se dá invariavelmente no campo das relações de poder.

Nessa perspectiva, se concebemos a identidade como uma construção cultural, um efeito, um processo de produção, uma relação que depende da alteridade, ela também deve ser entendida, fundamentalmente, como uma categoria de distinção que serve para demarcar as igualdades e as diferenças existentes entre os grupos sociais. Ou sej a, "uma cultura particular não produz por si só uma identidade diferenciada: esta identidade resulta unicamente das interações entre os grupos e os procedimentos de diferenciação que eles utilizam em suas relações".

Desse modo, a partir de um processo baseado em oposições notadamente do campo simbólico, inicia-se a construção de uma identidade que se manifesta no interior das relações de poder como uma categoria de distinção, demarcando as igualdades e as diferenças entre os grupos sociais, a partir da singularidade de um grupo perante o outro.

A partir dessa problematização, este capítulo tem como objetivo refletir sobre o processo de formação da Sociedade Portuguesa Beneficente Primeiro de Dezembro, associação fundada na capital paranaense em 1878, com o fim de analisar o modo como determinadas práticas culturais foram estabelecidas naquele espaço de integração e solidariedade. Nessa reflexão interessa especialmente investigar quais foram as estratégias utilizadas pelo grupo responsável pela criação daquela entidade na tentativa de demarcar fronteiras étnico-identitárias não só em relação à população local, mas sobretudo em relação aos demais grupos de imigrantes europeus que também se fixaram em Curitiba no mesmo período.

Porém, antes de chegar ao ponto pretendido, dois aspectos merecem ser salientados. Em primeiro lugar, é importante destacar que, ao dirigir o foco de análise sobre os imigrantes ligados à SPBPD, estamos privilegiando apenas uma parcela da população portuguesa que se fixou em Curitiba na segunda metade do século 19 . Em segundo lugar, coiwém salientar que, longe de tratá-los como uma camada única, coesa ou homogénea, este estudo parte do pressuposto de que havia diferenciações no interior do próprio grupo filiado à entidade articuladas ao tempo de inserção de cada um dos integrantes na sociedade curitibana, o que, por sua vez, daria condições materiais e de relacionamentos socioculturais diversos a cada um deles.